É difícil de escrever sobre os sentimentos e sensações que esta experiência desperta em mim. É um misto de sentimentos indescritíveis. Próximo a viagem senti muita ansiedade, medo, coragem, vontade de abandonar a ideia e emoção por estar próximo de uma grande aventura. Naquele dia 05 de outubro, entrei no ônibus para não voltar mais para casa. Afinal, como diria Heráclito: "um homem nunca entra no mesmo rio duas vezes, pois quando ele volta, nem o rio é o mesmo, nem o homem é o mesmo homem". Era assim mesmo que sentia e pensava que seria, quando voltasse já não seria mais o mesmo.
Me despedi dos meus pais na rodoviária e me joguei no mundo. A sensação de liberdade encheu meu peito, bem como a preocupação de me virar, literalmente, sozinho nos próximos meses. Eu já tinha morado sozinho e até viajado, porém, essa experiência seria única. Sabia que iria transpassar barreiras físicas, sociais e psicológicas. Iria superar desafios, os quais eu nem sabia quais seriam. Aquilo me dava uma pequena dose de receio e uma grande vontade de chegar logo na primeira cidade.
Entretanto, a viagem até Porto Alegre seria longa. Mais precisamente de acordo com a previsão cerca de 21h. Eu já estava preparado psicologicamente para isso. Fiz essa opção pelo transporte terrestre. No começo dei sorte, não tive ninguém do meu lado, então, pude usufruir dos dois bancos e relaxar. Porém, algumas cidades para frente uma moça senta ao meu lado. Esse fato, além de diminuir meu conforto, também gerou a primeira inquietação e reflexão e do mochilão. Mas, essa história, eu conto no outro texto, pois merece atenção especial.
#Pracegover: Foto colorida de uma estrada. Ao fundo uma cadeia de montanhas, céu azul com nuvens. Na parte superior escrito. "Um dia é preciso parar de sonhar e, de algum modo, partir!. Na parte inferior "Diário de Um Mochileiro: Dia 01. Abrindo a Cabeça pela América do Sul.
A viagem foi tranquila, algumas coisas me chamaram a atenção. A primeira: as paradas foram nos piores restaurantes de beira de estrada do mundo, com comida péssima. Acho que foi bom para já sair logo de cara da zona de conforto. A segunda coisa foram as conversas no ônibus. Algumas pessoas falavam no celular tão alto que todos os passageiros já sabiam que o Pedro estava de castigo, onde estavam os remédios do Afonso e até mesmo coisas mais intimas e pessoais. Mesmo, sem querer prestar atenção, acabava ouvindo as mais engraçadas histórias, por conta do tom alto adotado pelas pessoas.
Um dos aspectos importantes também desse primeiro trecho foram as primeiras pessoas que conheci na jornada. Numa viagem longa, como esta, você acaba fazendo “amizades”. Afinal, fica um dia inteiro viajando com as mesmas pessoas. Peguei um ônibus em minha cidade, Ourinhos, que iria até Porto Alegre. Mas, o busão vinha de Brasília, logo tinha pessoas de vários lugares diferentes, formando uma verdadeira concha de retalhos humana. Dentro daquele ônibus haviam todas as histórias possíveis. Gente passando férias na casa de amigos, indo ao médico, revendo parentes, indo a trabalho, visitando familiares, filhos, mães reencontrando pais, visitando aquele namorado que mora a muitos quilômetros de distância. E um mochileiro.
Mesmo com essa variedade de histórias, a minha começou a chamar atenção para maioria das pessoas. Numa dessas decidas, num papo rápido com alguns passageiros contei sobre o mochilão e logo adjetivos como “Louco” foram vinculados a minha pessoa.
Basicamente o dialogo com os demais passageiros era assim:
- Está indo para onde?
Porto Alegre
- Fazer o que?
Para conhecer, estou começando um mochilão.
Mochilão? O que é isso?
Ah, vou viajar pela América do Sul. Pretendo chegar até a Colômbia.
Mas como? Sozinho?
É, sozinho!
VOCÊ É LOUCO! ... (alguns segundos de pausa dramática) MAS, POW QUE LEGAL! QUERIA FAZER ALGO ASSIM. PORÉM, ....NÃO TENHO CORAGEM (Ou insira aqui algum outra desculpa). BOA SORTE!
Depois de receber várias vezes o rótulo de louco e escutar confissões de desconhecidos sobre uma vontade de cair na estrada, comecei a perceber que realmente estava no caminho certo. Se por algum momento tive dúvida sobre o mochilão, ali tive certeza do que estava fazendo. Pois, eu nunca quis receber o rótulo de normal. Na verdade, nunca quis receber rótulo nenhum. Porém, sempre quis fazer algo diferente, queria ter uma história legal para contar para os meus netos e também para colocar na minha lápide. Agora já poderia colocar “Aquele que não aceitou a loucura da normalidade e caiu na estrada”. Mesmo que com prazo determinado de volta, eu estava realizando o meu sonho e de muitas pessoas também. Por isso, a missão era aproveitar o MÁXIMO POSSÍVEL dessa experiência.
Ao mesmo tempo, percebi que talvez o mochilão seria um desafio ainda maior, pois todos desejam BOA SORTE e enfatizavam os perrengues que eu enfrentaria. Afirmavam que era necessário muita coragem para enfrentar tudo sozinho. Ouvir aquilo era como um combustível, era animador. Cada passo dado ao longo da viagem tornou-se uma vitória ainda maior. Pois, muitos no começo do caminho diziam ser algo impossível de realizar. Assim, a chegada a cada destino, cada dia na estrada era uma nova vitória.
Desta maneira, a cada parada em uma nova cidade, o ônibus ia ficando mais vazio, com a descida dos passageiros e meu coração acelerava, afinal estava mais perto do meu primeiro destino. A "primeira vitória" se aproximava. No final, após longas 20 e poucas horas, no dia seguinte ao amanhecer eis que acordo na entrada de Porto Alegre. Mas, isso já é história pro segundo dia diário!
Fique ligado nos próximos capítulos e em comigo Abrir a Cabeça pelas ruas de POA!